14 de dez. de 2015

Acordo contra garimpo ilegal na fronteira da Guiana segue no papel

Garimpo ilegal flagrado no entorno de áreas protegidas no Amapá, no fim de 2012. Foto: © Divulgação / ICMBio
Em países vizinhos de colonização espanhola, a população costuma afirmar que Del dicho al hecho hay un largo trecho, algo como “Do dito ao feito há um longo caminho”, sempre quando a política oficial empurra ações para o futuro com a barriga da inoperância.

Pois, caminha para mais um aniversário o acordo que os então presidentes Lula e Sarkozy firmaram em 23 de dezembro de 2008 para que Brasil e França arregacem as mangas e ajam juntos contra os estragos sociais e ambientais do garimpo ilegal de ouro em larga faixa de fronteira entre o Amapá e a Guiana Francesa.

Estimativas do Governo Francês corroboradas por organizações não governamentais dão conta de pelo menos 20 mil brasileiros garimpando dentro e fora de áreas protegidas no país vizinho. Em meio à Floresta Tropical, a atividade clandestina é protagonizada por pessoas essencialmente pobres, trabalhando sob condições degradantes e alijadas de alternativas de emprego e renda. A prática é fonte de contaminação e de violência.

O mercúrio é usado em garimpos clandestinos ou de pequena escala para separar o ouro de outras substâncias. Indígenas e habitantes de pequenas comunidades amazônicas padecem por consumirem peixes e água contaminados pelo metal, em níveis bem acima dos aceitos pela Organização Mundial da Saúde. Até 15 milhões de pessoas podem estar com a saúde comprometida pelo mercúrio na América do Sul, na África e na Ásia.

Nos últimos anos, operações policiais e militares contra a prática levaram mortes e agressões a ambos os lados da fronteira. Em 2010, na Guiana Francesa, foram presos 1500 estrangeiros. Dois militares franceses foram mortos em junho de 2012 e, em abril do mesmo ano, uma centena de garimpeiros brasileiros foi detida no país vizinho. Já em junho de 2014, um barqueiro brasileiro foi morto por um policial francês ao transportar alimentos e material de trabalho para garimpos ilegais.

Parlamentares e organizações não governamentais europeias têm alertado publicamente para a possível escalada dos problemas frente à inação governamental.

O aperto de mãos Brasil-França esteve no congelador até o fim de 2013, quando a passagem do presidente François Holande por Brasília levou à aprovação do acordo pelo Congresso Nacional e, poucos meses depois, a sua ratificação pelo Brasil. Todavia, até agora não há movimentos práticos para tirar o tratado do papel e, se espera, transformá-lo em fonte de alternativas pacíficas e sustentáveis ao garimpo ilegal.

As ações que brotarem do diálogo binacional podem levar soluções a outros polos de garimpo ilegal em países vizinhos e no Brasil. São estimados 450 mil garimpeiros em atividade no país, especialmente na Amazônia.

O Brasil não produz mercúrio, mas a entrada da substância no país para atividades ilegais ainda não despertou a curiosidade da Polícia Federal. Deveria. Afinal, banir os usos clandestinos e reduzir gradativamente os usos autorizados do metal nos próximos 5 anos é um dos deveres de casa do Brasil como signatário da Convenção de Minamata das Nações Unidas.


FONTE: Texto de Aldem Bourscheit para O Eco, disponível também aqui

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