Quando avisou que deixaria o cargo de coordenador-geral de Infraestrutura do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), no início de novembro, Leozildo Tabajara da Silva Benjamin recebeu o pedido para que ficasse por mais um mês. Com tantos processos em evidência nas mãos do Ibama, um dos responsáveis por licenciamento ambiental do órgão precisaria aguentar mais um tempo “dando murro em ponta de faca”, como ele diz. Na terça-feira (1º), ele recebeu a informação de que poderia deixar o cargo. Só não sabia que, na manhã desta quarta (2), veria a informação de que seu colega, o diretor de Licenciamento Ambiental, Sebastião Custódio Pires, seria exonerado. As saídas ocorrem em meio a pressões para que seja rapidamente liberada a licença ambiental da hidrelétrica de Belo Monte, cujo leilão o governo esperava realizar antes do Natal. Em entrevista à Rede Brasil Atual, Benjamin não esconde a irritação com o ministro de Minas e Energia, Édison Lobão, por marcar data para o leilão antes de ter o licenciamento em mãos. “O Ibama não é cartório para dar só a licença. A gente precisa dar a licença com um processo sólido, adequado, e depois monitorar tudo isso. A moçada pensa diferente, e dá no que dá”, sentencia. Ele reclama das más condições de trabalho, com baixos salários, alta demanda, pressões exageradas e falta de pessoal. O ex-coordenador, que em breve retorna para o Ibama no Amapá, considera que não é possível culpar o instituto pela falta de habilidade no planejamento público. Confira a entrevista exclusiva: RBA – Por que o senhor tomou a decisão de pedir exoneração do cargo? Eu fiz isso no dia 5 de novembro. Achei que tinha feito minha parte, que as coisas que eu queria que tivessem um avanço maior, outra pessoa poderia avançar. Como sou funcionário da casa, conheço bem a estrutura e como funcionam as injunções políticas do próprio Ministério do Meio Ambiente em relação ao Ibama. Eu diria que há até um ciúme meio edipiano. Porque o Ibama foi criado antes do ministério, então há uma certa inversão de o filho ter criado o pai, ou a mãe. Toda essa estrutura técnica, política, que a gente vem acompanhando há algum tempo, não vai avançar do jeito que eu pretendo levar, que é sempre ter um processo sólido, defensável em qualquer instância. Como vi que estava começando a não ter certa primazia aquilo que eu estava fazendo, achei que era o momento de parar. RBA – Qual o seu contato com o diretor de licenciamento, Sebastião Custódio Pires? A gente sempre trabalhou muito bem. Eu, o Sebastião e o presidente do Ibama. Tem algumas coisas que a gente procurou fazer dentro da instituição, que é dar uma dinamizada nos núcleos de licenciamento ambiental, e eu achei que a gente poderia ter feito melhor; a desconcentração das atividades, que a gente gostaria que tivesse avançado mais. Também tem a questão do pessoal. Queríamos melhores condições de trabalho, uma remuneração melhor porque não dá para conceber alguém que emite parecer sobre uma Belo Monte da vida com esse salário. É uma remuneração hiperinadequada e para pouca gente. Achei que, da parte que nos cabia fazer, a gente estava no limite do limite. Precisaria ter um entendimento melhor por parte do governo, particularmente do Ministério do Meio Ambiente, sobre a necessidade de melhorar nossa situação. Eu decidi que ficar batendo cabeça a torto e a direito não é do meu feitio. Compreendo as idiossincrasias da política, mas entendo que não é necessário ficar dando murro em ponta de faca. Quem sabe mudando não vão dar as condições adequadas para que o processo possa melhorar? Achei que me afastando chamaria atenção para a coisa melhorar. Mas parece que não. Já tiraram a cabeça de mais um, podem até acabar tirando a cabeça do Roberto (Messias Franco, presidente do Ibama). Parece que não querem resolver a questão. RBA – Quem não quer resolver a questão? Se todo mundo tem conhecimento de causa do que está acontecendo, por que não melhora salário? Por que não melhora as condições de trabalho? Por que não aposta em mais gente? Por que não tem um planejamento adequado para que não chegue no licenciamento e crie um gargalo? Sempre vão dar a entender que o Ibama é o responsável por travar isso aí, quando não é verdade. Se a condição sine qua non para que possa fazer o leilão é ter uma licença, não pode marcar o leilão para depois ficar correndo atrás da licença naquele prazo em que foi marcado. Para mim, é jogarem toda a carga para cima de quem deveria ser olhado com mais cuidado. O Ibama não é cartório para dar só a licença. A gente precisa dar a licença com um processo sólido, adequado, e depois monitorar tudo isso. A moçada pensa diferente, e dá no que dá. RBA – A pressão do Ministério de Minas e Energia foi decisiva para sua saída? Não. Alguns ministros, para aparecerem na mídia, ficam dando prazo para outros ministérios ou para instituições que não estão subalternas a eles. O ministro deveria pegar e mostrar para o presidente que tem problema e de qual ordem é o problema, e não ficar mandando recado para o Ibama e para o Ministério do Meio Ambiente pela imprensa. Para mim, é falta até de coordenação de governo. Se um ministro dá pitaco na pasta do outro, alguma coisa não está correta. Se ele (Édison Lobão) achava que poderia sair naquele momento o licenciamento, que puxasse para o Ministério de Minas e Energia ou para outro setor. Mas determinar datas achando que vai deixar (outro órgão) refém disso aí? O Ibama não é refém de ninguém. Quando sair a licença, que marque o leilão. RBA – Como está o andamento da licença? Só posso dizer até ontem. Saiu o parecer 114, que coloca algumas complementações que o empreendedor precisa fazer. Essas complementações devem chegar ao Ibama para a equipe analisar e então pensar na licença. É um processo que precisa ser trabalhado solidamente. Não adianta no grito, que no grito não dá para sair. Se quiserem no grito, alguém pode assumir a responsabilidade da licença ambiental e dizer que vai sair tal dia porque vai assinar. É muito fácil cobrar que não saiu sem assumir responsabilidade. Depois, não são essas pessoas que estão falando aí que vão responder na Justiça, para o Ministério Público, para o TCU (Tribunal de Contas da União), para a AGU (Advocacia Geral da União). Essas pessoas vão ficar depois de “flozô” em seus respectivos estados, quando saírem candidatos (nas próximas eleições) naturalmente. É imprescindível que saiam mais hidrelétricas para garantir o abastecimento do país. Porque, se a gente crescer, vai faltar energia. Se não tratar a coisa adequadamente, pode sim faltar energia no país, desde que cresça só um pouquinho. E quem é responsável por isso? O Ibama? Não. É quem não sabe planejar, quem não sabe fazer política pública, quem precisa atuar mais detidamente no seu metiê e esquecer o metiê dos outros – ou pelo menos deixar que os outros trabalhem. RBA – Diz-se que a ministra Marina Silva conseguia controlar um pouco melhor os ímpetos externos sobre o Ibama. O senhor concorda? Acho que cada ministro, cada presidente, tem sua maneira de administrar. O que tem de ficar muito claro é que o Ministério do Meio Ambiente dá a diretriz para a política ambiental do país. Ponto. O Ibama executa a política pública ambiental do país. Ponto. Se isso não ficar bem claro, e ministério quiser licenciar, o Ibama dar diretriz ambiental para o país, alguma coisa está errada. É preciso saber separar as coisas porque, se não, não se avança. RBA – A questão de falta de pessoal é um dos motivos para que a licença de Belo Monte não tenha saído no prazo que queria o ministro Lobão? Não é só a questão de Belo Monte. É a bola da vez, mas não é só isso. (Em) vários outros empreendimentos, são pouquíssimas pessoas para tocar o licenciamento. São poucos técnicos para muitos processos em andamento. É a questão da prioridade. Se querem dar prioridade para algum empreendimento sair, é preciso que se tenha uma força maior. O que não pode é, com essas condições, quererem que todos os processos saiam adequadamente. Claro que alguns vão ser postergados porque não há capacidade de pessoal para atender a essa demanda. São muitos processos, pouca gente e todo mundo querendo que seu processo seja o primeiro a sair. RBA – Há pressões tanto do lado do governo, querendo acelerar, quando de organizações da sociedade civil, querendo frear. Isso aconteceu pessoalmente com você? Como eu sou calejado na questão do licenciamento, aceito todas as pressões legítimas. Acho que as ONGs estão corretas em pleitear informações, o Ministério Público está correto em pedir que seja observada a legislação, que o processo seja transparente. Os índios, ribeirinhos, pescadores, todos fazem parte de um processo legítimo que a gente não vê problema nenhum. Pressões legítimas recebemos de todos os lados e são importantes, melhoram os processos. O que não é bem-vindo é a exacerbação da pressão, a pressão inoportuna. Agora, querer que a licença saia no tal dia é pedir demais. RBA – Há problemas no caso de Belo Monte? O projeto veio quadrado? A gente está trabalhando para que não fique nada quadrado. Nenhum processo chega para a gente a 100%. E você sinaliza para o empreendedor melhorar. Se nesse entendimento a coisa está avançando, e isso está ocorrendo com Belo Monte, não vejo por que não seguir avançando. O que não pode haver é ruptura de processo. Se continuar com o Ibama solicitando e os empreendedores atendendo, o processo flui naturalmente e a licença sai também naturalmente. Não precisa todo esse auê, não precisa toda essa exacerbação de ministro cobrar, bater. Eles têm os fóruns adequados para cobrar isso, e não é na mídia. Senão, dão o direito para outras pessoas também cobrarem na mídia e deixam o rei nu. Se querem isso, isso podem ter.FONTE: Marquinho Mota (Assessoria de Comunicação da Rede FAOR)
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4 de dez. de 2009
Exclusivo: ex-coordenador do Ibama acusa Lobão
Texto de João Peres
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